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Crise de ansiedade coletiva atinge 26 alunos em escola pública

‘Cenário era de filme de terror’, diz pai de uma das estudantes sobre o episódio

Foto: Reprodução/WhatsApp

Uma situação incomum e extremamente preocupante aconteceu na última sexta-feira (8) em uma escola estadual no Recife, onde 26 estudantes tiveram uma crise de ansiedade coletiva e precisaram receber atendimento médico na instituição.

Foi na Escola de Referência em Ensino Médio Ageu Magalhães, no bairro de Casa Amarela, na Zona Norte do Recife, que os alunos passaram mal juntos.

Os adolescentes estavam em semana de provas e, em uma espécie de ‘reação em cadeia‘, foram apresentando falta de ar, tremor, crise de choro, sudorese, saturação baixa e taquicardia, segundo profissionais do SAMU (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) que realizaram os atendimentos.

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Segundo relatos, alguns estudantes começaram a gritar e os outros ouviam de outras salas e gritavam também, sendo contagiados pelo desespero.

“Minha filha saiu da escola com uma amiga. Ela disse que o cenário era de filme de terror, com correria e tumulto. Já no ônibus, ela me ligou dizendo que tinha deixado a escola e estava indo para casa”, contou ao ‘G1’ o pai de uma aluna, que preferiu não se identificar.

“A escola não entrou em contato comigo na hora. Um colega de sala da minha filha me ligou e fui até a escola. Chegando lá, vi seis ambulâncias e, na entrada, vários adolescentes, alguns desmaiados, alguns chorando bastante“, disse uma mãe.

A escola é muito séria, não é à-toa que seja uma escola de referência. Sou muito satisfeita com a gestão, mas, diante dos sintomas, não tenho dúvidas que foi uma crise de ansiedade coletiva, disse Luciana Amorim, mãe de uma aluna, em entrevista ao ‘G1’.

Crise de ansiedade coletiva

Apesar de as razões da crise de ansiedade ter atingido 26 estudantes ao mesmo tempo na escola ainda serem incertas, a mãe de uma das alunas acredita que isso aconteceu devido às cobranças por resultados a que os estudantes são submetidos.

“São cobranças, responsabilidades. Alguns não conseguem suportar e entram em surto. É complicado”, afirmou Luciana.

A mãe de outra aluna de 15 anos que estava entre o grupo de estudantes que teve a crise de ansiedade relatou, em entrevista, o que ela acredita que motivou a reação dos adolescentes.

“Há algumas semanas, fiquei sabendo que um aluno levou uma arma para a escola e mostrou na turma dele. Por isso, o desespero de ser algo mais grave, entende?”, revelou a mãe.

“Alguns pais não sabem disso, mas os estudantes sabem. Entre fevereiro e março, também foi registrado um episódio de agressividade, de uma aluna que deu um soco no olho de outro aluno“, disse ela.

O retorno das aulas integrais após a paralização por conta da pandemia também pode ter sido demais para os alunos, conforme pensa essa mãe.

“A escola dispõe de alguns professores para falar com os alunos, para saber como anda a convivência”, entretanto, ela acredita que a readaptação dos adolescentes às aulas integrais deveria ser gradual.

“Minha filha voltou às aulas em meados de novembro de 2021. A carga integral é complicada. Esses alunos saíram de uma carga horária de cinco horas na pandemia e, atualmente, estão com uma carga horária de nove horas, disse.

O governo estadual declarou que a escola realiza um trabalho voltado à educação emocional dos alunos, incluindo orientações dos jovens e dos responsáveis deles sobre esse tema.

Por nota, informou ainda que os estudantes receberam atendimento médico na unidade escolar e foram liberados após a chegada dos parentes.

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Veja uma foto da fachada da escola:

Escola - Recife
Foto: Pedro Menezes/Divulgação

Psicoterapeuta explica possíveis causas do fenômeno

Diante do ocorrido na Escola de Referência em Ensino Médio Ageu Magalhães, no Recife, o psicoterapeuta cognitivo-comportamental Igor Lemos afirmou, em entrevista ao ‘G1’, que alguns fenômenos na psicologia podem ser desencadeados de forma coletiva.

O especialista apontou que existe o chamadoadoecimento partilhado“, que age como efeito dominó.

“Não é só a questão da ansiedade, mas de alguns outros tipos de adoecimento. Um dos pontos é que o ser humano possui um caráter muito intenso a nível empático. Vamos pensar, inicialmente, como uma empatia coletiva. A dor que tenho pode ser compartilhada para o outro e a dor do outro também pode ser para mim compartilhada, afirmou o especialista.

“Se uma pessoa está com a saúde mental em dia e acaba se relacionando com uma pessoa que tem um funcionamento muito desequilibrado, ela adoece junto porque o cérebro mimetiza. Porém, de maneira coletiva, num grau como foi na escola, não é tão comum“, disse Igor Lemos.

Segundo o psicoterapeuta, a pandemia da Covid-19 desencadeou grandes estresses em toda a população, inclusive nos adolescentes.

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De acordo com estimativa da Organização Mundial de Saúde (OMS), a ansiedade afeta 18,6 milhões de brasileiros. E a Covid-19 contribuiu para que esses transtornos mentais se agravassem.

Infelizmente, as queixas de uma pessoa que está com sintomas de ansiedade e depressão ainda são vistas com desconfiança e julgamentos por parte de muitos. A saúde mental continua sendo um tabu para muitas pessoas, que desqualificam o que o outro está sentindo.

O psicoterapeuta entrevistado pelo ‘G1’ acredita que o que aconteceu na escola no Recife é uma prova de que os danos psicológicos causados pela pandemia não serão superados rapidamente por todos.

“Nem sempre o corpo responde de forma imediata. Às vezes, são necessários meses, anos (para se recuperar). Estamos em uma situação que ainda não acabou, em uma pandemia. São dois anos vivenciando isso. Hoje, a gente colhe reflexos. E, digo mais, a gente vai colher reflexos além, na frente ainda”, afirmou o psicólogo.

Com a flexibilização dos protocolos de segurança, a volta das aulas presenciais e da pressão do dia a dia escolar, os estudantes desenvolveram uma alta carga de estresse que causou a crise de ansiedade na última sexta-feira.

“Eles tiveram afastamento das aulas, ensino remoto, dificuldade de compreensão. Quando você traz a pessoa de volta, gera um nível de estresse absurdo. Fora as cobranças, o aumento do desemprego, a questão da violência, movimentos políticos. O Enem, ano passado, teve o maior nível de evasão. E isso gera, sim, uma chance maior de ser um gatilho para gerar adoecimentos vinculados à ansiedade“. 

Ainda de acordo com o psicoterapeuta, os adolescentes precisam de acolhimento. “Algumas pessoas acham que se resolve na base da porrada, mas a geração atual precisa de acolhimento. Essas pessoas buscam ajuda quando o sofrimento se torna insuportável, debilitante, estressante, uma bola de neve”, afirma Igor Lemos ao ‘G1’.

Para controlar a ansiedade, segundo o especialista, é necessário iniciar um processo terapêutico para descobrir as causas e trabalhar sobre elas.

“Pode ser avaliado o uso de psicofármacos, com psiquiatra, para tratar transtornos de ansiedade mais predominantes”, disse o psicoterapeuta.

Técnicas de relaxamentos, regulação emocional por meio da respiração diafragmática e automassagem também podem auxiliar na redução da ansiedade, segundo psicólogo Igor Lemos.

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