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Entenda o que é o ‘efeito contágio’, que pode estimular novos ataques a escolas

Especialistas explicam porque a notoriedade dos criminosos incentiva outros a agirem também

Foto: Reprodução/RBS TV

O Brasil tem assistido estarrecido o acontecimento de cada vez mais ataques contra escolas espalhadas pelo país. Em menos de 10 dias, dois ataques foram registrados. O chamado “efeito contágio” pode ser uma das explicações para esses trágicos números.

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Na última semana de março, um adolescente de 13 anos matou uma professora a facadas e feriu outras cinco pessoas em uma escola na Vila Sônia (SP).

Já nesta quarta-feira (5), um homem de 25 anos pulou o muro de uma creche particular em Blumenau (SC) e assassinou covardemente quatro crianças com golpes de machadinha na cabeça.

Diante disso, a Polícia Civil tem registrado muitos boletins de ocorrência de estudantes planejando e ameaçando atacar alunos e professores em escolas de diferentes cidades do Brasil.

A Polícia Civil de São Paulo, por exemplo, informou ter registrado sete boletins de ocorrência envolvendo planos de adolescentes de possíveis ataques à escolas – apenas entre os dias 27 e 28 de março.

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De acordo com informações da ‘Agência Brasil’, o secretário da Segurança Pública reforçou o pedido para que as pessoas parem de compartilhar imagens do ataque ocorrido dentro de uma escola estadual na Vila Sônia (SP) na manhã de segunda-feira, 27 de março.

A Secretaria de Segurança Pública de São Paulo está preocupada com o chamado efeito contágio, termo baseado em pesquisas, que apontam estímulo a casos semelhantes quando a mídia repercute um massacre.

Depois do ataque desta quarta-feira (5), assunto voltou a ser bastante discutido por diferentes órgãos de segurança e também veículos de comunicação.

O ‘Estadão‘, um dos maiores jornais do país, e também o Grupo Globo determinaram que a partir de agora não divulgarão mais a identidade dos criminosos que atacam escolas, nem imagens dos ataques.

O motivo? Especialistas em ações violentas afirmam que essa visibilidade dada pela mídia tem incentivado novos casos de ataques em escolas.

A suspeita é de que a ampla divulgação de imagens do atentado ocorrido na escola da Vila Sônia, no qual uma professora morreu e cinco pessoas ficaram feridas, assim como de outros ataques já ocorridos no Brasil e no mundo, esteja motivando novas ações.

Segundo depoimento à Justiça prestado pelo autor do atentado à escola de SP, o menor disse que se baseou em exemplos que viu na mídia.

O secretário da Segurança Pública de SP, Guilherme Derrite, pediu à imprensa para que cesse a divulgação de imagens do ataque na escola da Vila Sônia. Derrite acrescentou que quem compartilhou mensagens com o autor do crime, pela internet, também será investigado.

Creche Bom Pastor
Foto: Felipe Sales/Reprodução/NSC TV

Sem vítimas, país teve inúmeros casos recentes

Em uma das ocorrências, envolvendo novos planos de ataques que chegou à polícia pelo Disque Denúncia, um adolescente do 9º ano do Ensino Fundamental foi armado ao colégio, na capital paulista.

Em Itapecerica da Serra, na região metropolitana, uma mãe relatou que o filho foi ameaçado por outro estudante, que teria prometido um ataque similar ao da Vila Sônia.

Em outra ocorrência, PMs foram informados de que um aluno estava próximo da escola com uma arma e os agentes constataram que o jovem portava um revólver “de brinquedo”.

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Já em Santo André, um estudante ameaçou a professora durante a aula, dizendo que os educadores deveriam ser esfaqueados e que ele faria isso no dia seguinte.

Também houve registro de um aluno portando um punhal em escola de São Bernardo do Campo.

Outros estados também registraram boletins. Na tarde de terça (28), a Polícia Militar do Rio de Janeiro foi acionada, depois que um aluno foi contido por funcionários da Escola Municipal Manoel Cícero. Ele tentou atacar colegas com golpes de faca.

Em Águas Claras, no Distrito Federal, o batalhão escolar da Polícia Militar foi acionado após um aluno criar um perfil no Instagram, ameaçando fazer um massacre no colégio de ensino fundamental onde estuda.

No dia 29 de março, o jovem se apresentou na escola junto aos pais e seguiu para Delegacia da Criança e do Adolescente para prestar depoimento.

Pesquisadora explica o ‘efeito contágio’

A ‘BBC News Brasil’ publicou uma matéria exatamente sobre esse “efeito contágio”.

Eles entrevistaram Michele Prado – pesquisadora do Monitor do Debate Político no Meio Digital da USP – e ela declarou que este fenômeno pode ajudar a explicar a proximidade entre os ataques da creche em Blumenau e da escola na Vila Sônia (além de todos os outros supracitados).

A especialista em radicalização alerta: novos ataques podem acontecer. “Estamos no que chamamos de ‘janela de efeito contágio’, quando há um potencial de imitadores”, diz Prado.

“Quando a mídia publica imagens do agressor ou cenas do atentado, tudo isso potencializa esse efeito contágio para outros que estão sendo radicalizados. Eles se sentem mais mobilizados a cometer atentados que já estavam planejando”, declarou.

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De acordo com Michele, essa “janela” dura cerca de 13 ou 14 dias após um ataque acontecer e ganhar notoriedade.

“O ataque de Blumenau parece estar ligado a subculturas extremistas online. Algumas dessas subculturas vêm planejando atentados simultâneos. Então há um potencial grande para o ataque de hoje não ser único”, afirma especialista.

Sobre Blumenau, o delegado-geral da Polícia Civil de Santa Catarina, Ulisses Gabriel, afirmou em coletiva de imprensa que foi um “caso isolado” e que não há indícios de que o ato foi coordenado por outros indivíduos por meio de redes sociais, jogos ou outras plataformas virtuais.

Ainda segundo a especialista, o ataque cometido pelo adolescente de 13 anos na escola da Vila Sônia foi muito comemorado nessas comunidades de ódio online, pois mesmo tendo sido realizado com arma branca, resultou em morte.

“Em algumas dessas subculturas, eles já estavam anunciando e instruindo que os alvos deveriam ser mais vulneráveis. Então o agressor de Blumenau pode ter buscado uma creche, pois ali as vítimas são mais vulneráveis a um ataque de arma branca”, avalia a pesquisadora.

É um fato que ataques a escolas têm se multiplicado no Brasil nos últimos anos. Segundo levantamento feito pela pesquisadora Michele Prado, foram 22 ataques entre outubro 2002 e março de 2023.

Esses números foram calculados antes do caso de Blumenau e sem incluir na conta um ataque a faca em escola no Rio de Janeiro. 11 desses casos foram registrados somente em 2022 e 2023.

Contando os dois casos mais recentes, portanto, os últimos dois anos já superam em número de ataques a escolas cometidos nos 20 anos anteriores. A maioria dos agressores são jovens de 10 a 25 anos, brancos e do sexo masculino.

Cantinho Bom Pastor - Blumenau creche
Foto: Arquivo Pessoal

O que fazer diante dessa realidade?

Daniel Cara – professor da Faculdade de Educação da USP e um dos coordenadores da equipe de transição do governo Lula para a área de Educação – acredita que os ataques são resultado da disseminação cada vez mais forte de discursos de ódios em todo o mundo.

“É uma sociedade que não tem enfrentado a emergência do discurso de ódio, que é um problema global, não um caso específico do Brasil“, afirmou Daniel à ‘BBC Brasil’.

De acordo com ele, entre as culturas mobilizadoras desses ataques estão a do ódio às mulheres, a do racismo e a exaltação de símbolos neonazistas e fascistas. “Esse é um tema que o Brasil resiste a enfrentar”, avalia.

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Essa é uma questão bastante complexa, multifatorial e que precisa de uma articulação da sociedade para seu enfrentamento.

O especialista afirma que é necessário monitorar o discurso de ódio na internet; realizar campanhas de conscientização e condenação social sobre ataques nas escolas; processos de formação nas escolas sobre o risco de ataques e prevenção a eles; além de protocolos para lidar com ataques e para evitá-los.

“Essa é a maior urgência, porque, por exemplo, a própria forma como a imprensa tem lidado com os ataques acaba realizando o objetivo dos atacantes: ter a imagem deles divulgada, ganhar notoriedade. Por isso o efeito [do ataque] de São Paulo gerou gatilhos”, observa Daniel Cara.

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